Peço a Palavra
terça-feira, novembro 16, 2004
 
Ad Majorem Dei Gloriam
Há uma pergunta que os católicos devem formular quando se movimentam na polis: até que ponto o meu catolicismo deve condicionar a minha praxis política? Qualquer indivíduo movido pela Fé, esteja ele a exercer os direitos e deveres políticos em posições com maior ou menor visibilidade, deve colocar-se constantemente esta interrogação. Ou mais ainda: em que medida contribuo para a realização do Plano de Deus?
Ora, o nosso quotidiano revela que essa pergunta é cada vez menos formulada. Ao contrário, é cada vez mais audível no debate público o entendimento de que se deve traçar uma crescente dissociação entre a Fé que certos agentes políticos dizem ter e os seus próprios comportamentos. E esse divórcio é-nos proposto, ad nauseam, ao nível jusante dos titulares de cargos políticos e ao nível montante do cidadão comum que tem de tomar a opção essencial e, muitas vezes, diária. A ideia é esta: deve ter-se uma moral (a que quisermos) para utilizar na nossa vida de relacionamentos directos; e outra moral (anódina) para tratar assuntos que respeitam à comunidade, essa mole não-identificada que é saco para se meter de tudo. Como se dissesse que as virtudes são sapatos para se usar só em casa.

Sucede que essa não deve ser a postura de um católico. Para um católico, o compromisso com Jesus Cristo preenche toda a vida. A adesão é total. O que se retira deste postulado?
Retira-se que, como revelou Jesus Cristo, a relação humana é estabelecida em função do próximo. É o próximo que determina o nosso comportamento. A pessoa humana só se realiza -- em bom rigor, só existe -- se a concebermos em relação com o próximo. E o próximo não é apenas aquele que apreendemos com os nossos sentidos: o que está ao alcance da visão ou da audição. Porque o Mundo foi concebido por Deus, não pode haver uma hierarquização de mais longe e de mais perto, de antes e de depois -- Deus e a sua Igreja são omnipresentes e intemporais. Por isso, o próximo é aquele com quem temos laços por via familiar, social, nacional e (até) à escala da Humanidade. Mais: o próximo está também nas gerações passadas e nas gerações vindouras. Todo e qualquer um é um nosso próximo. Dito de outro modo: o Homem é uma rede de relacionamentos com todos os que lhe são próximos. E, por esse motivo, os valores com que conduzimos a nossa vida -- em função dos quais tomamos as nossas opções -- são os mesmos quer estejamos a decidir acerca do futuro do nosso vizinho quer nos debrucemos sobre o futuro de toda a comunidade.

É neste contexto que se deve entender que o exercício de qualquer direito ou dever políticos é instrumental da Fé -- e não o contrário. É por tudo isto que existem balizas morais inamovíveis no nosso comportamento e nas nossas escolhas. Não se abrem parêntesis na avaliação moral.
A afirmação da Fé deve verificar-se, consequentemente, tanto na definição de todo e qualquer objectivo político a perseguir quanto na definição dos meios que nos propomos lançar mão para o atingir. Seja qual for o plano em que estivermos.

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